Dia 1º de Maio é, desde 2011, Dia de Iracema. O marco foi criado para prestigiar a personagem de José de Alencar
FONTE:DN/CIDADE
por Jéssica Colaço, Samuel Quintela e Vanessa Madeira - Repórteres
Da Messejana ao Centro, do Mucuripe ao Edson Queiroz, a índia Iracema, virgem dos lábios de mel de José de Alencar, faz parte não só do passado, mas do presente de Fortaleza. A protagonista da obra cearense homônima, que em 2018 completa 153 anos de publicação, é símbolo da história da Capital e de seu povo, originado a partir do romance entre a personagem e o português Martim Soares Moreno. Tamanha representatividade lhe rendeu status de ícone cultural da cidade e data própria no calendário municipal.
Dia 1º de maio é, desde 2011, Dia de Iracema. O marco, prevista na lei nº9.884/2011, foi criado para prestigiar a personagem, preservar sua memória e fomentar o desenvolvimento de ações que difundam sua narrativa. Conforme explica a professora Maria Ednilza Moreira, docente do Departamento de Letras Vernáculas da Universidade Federal do Ceará (UFC) e uma das idealizadores da legislação, a obra de José de Alencar mistura ficção e realidade para, a partir da história de Iracema, contar a história do Ceará.
“Iracema é ícone cultural porque foi o romance do tipo lenda que Alencar escreveu para tratar do mito de formação do povo cearense a partir dos índios, e depois com a chegada dos portugueses”, destaca. “Os nativos são representados por Iracema, que era fictícia, e os portugueses, por Martim Soares Moreno, que era real”, acrescenta Maria Ednilza, que também coordena o projeto de extensão da UFC “Iracema: um retrato de Fortaleza”.
Referências
Segundo a professora, hoje, além de resguardada no romance que narra seus passos pela Capital, a memória de Iracema permanece viva na cidade nas estátuas erguidas em sua homenagem e até no hino de Fortaleza, que traz, na letra, referências à índia. No entanto, ela ressalta que, embora carregue grande significado para a cultura do Estado, a personagem ainda não foi totalmente apropriada pela população como ícone cearense. “É preciso socializar esse mito, sobre o qual nós deveríamos falar com muito mais espontaneidade do que falamos hoje. Iracema foi reconhecida, mas não chega às escolas, por exemplo. Muito pouco se fala sobre o processo de miscigenação do povo cearense a partir dela”, afirma.
Símbolos
Lei municipal estabelece que a Prefeitura deve manter as estátuas da índia (Foto: Fabiane de Paula)
Na Capital, há quem conheça a história de Iracema por meio da leitura da obra, do imaginário popular ou mesmo da relação com os símbolos físicos da índia espalhados pela cidade.
“Iracema é talvez o romance mais importante da literatura do Estado e retrata a época que houve justamente a aproximação entre os índios e o guerreiro branco, então é muito importante porque fala da junção das raças que formaram o povo brasileiro”, diz o professor Everton Queiroz, ao fotografar uma das estátuas de Iracema situadas na orla.
Também na praia que leva o nome da índia, o vendedor ambulante Carlos Augusto Silva conta que muitos de seus clientes acabam parando pela curiosidade de chegar à estátua próxima ao Aterrinho. O ponto de comércio informal, logo ao lado de Iracema, dourada após a restauração em 2012, também ajuda, diz Carlos.
“Há uns 12 anos que eu trabalho nesse ponto, e às vezes, os clientes vêm mesmo para ver a estátua e acabam comprando. E é legal porque eu conheço a história dela, contada pelo José de Alencar. Pessoal me conta até que a Iracema tinha um cavalo, e ia tomar um banho na Lagoa de Messejana”, lembra o vendedor.
A lei municipal que cria o Dia de Iracema também estabelece que o Município deve proteger e manter as estátuas da virgem dos lábios de mel, “bem como as demais representações simbólicas significativas relacionadas à personagem”. Em outros pontos da cidade, no entanto, a degradação de monumentos que representam a índia refletem e agravam o distanciamento da população e até do poder público da imagem de Iracema e do escritor José de Alencar.
Preservação
No Centro da cidade, o nome do escritor cearense é associado a um reduto de artes, mas também a abandono e descaso. Enquanto o Theatro José de Alencar resiste como espaço de fruição artística, patrimônio histórico e cultural e parada turística obrigatória, a praça de frente para o empreendimento, e que também carrega o nome do romancista, exibe sem discrição as evidências da falta de cuidado.
Pedras soltas no passeio, obras inacabadas, pichações e lixo acumulado são algumas das evidências. Ao centro da Praça, um monumento que homenageia o escritor – inaugurado em 1929 por iniciativa da Associação Cearense de Imprensa e que traz, em seu pedestal, uma talha de Iracema - quase passa percebido por quem caminha ali, ainda que a representação de Alencar seja revestida em dourado.
Trabalhando no logradouro há 22 anos, a autônoma Vilani Carneiro confessa saber pouco da história do escritor e de sua importância para a Cidade. “Eu acho que se a praça fosse mais organizada, do jeito que é o teatro, quase todo mundo ia saber da história dele”, admite ela.
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