O levantamento inédito, feito pelo Ministério Público Federal, possibilita o avanço das discussões acerca das políticas públicas que podem impactar positivamente nas comunidades tradicionais de extrativistas, ribeirinhos, ciganos, povos de terreiros, quilombolas, indígenas e pescadores artesanais
Fonte:Região/Por Redação, regiao@verdesmares.com.br
O que não é o caso da Vila Barreiro Novo, formada às margens da CE-060, no território da Flona, no limite entre Barbalha e Jardim. Com aproximadamente 44 casas de taipa e alvenaria, a comunidade de catadores foi se formando ao longo dos anos, mas ainda não conquistou a regularização fundiária. De janeiro a março, período que marca a safra do pequi, mais de 20 famílias se mudam para o meio da floresta para colher o fruto.
Desafios
Sem o conhecimento formal - e legal - os extrativistas do Cariri acumulam um peso ainda maior do verificado em outras comunidades do Estado. Se para os demais as políticas públicas já são deficitárias, na Chapada do Araripe os desafios vão além. Hoje, o principal problema é o abastecimento de água para algumas famílias. O recurso é obtido através de um poço profundo e enviado a uma caixa d'água, porém, nem todas as casas têm acesso. Na Vila Barreiro Novo uma cisterna é custeada pelos próprios extrativistas.
Outro problema enfrentado é o acesso à educação. As comunidades, de um modo geral, são desassistidas quanto ao transporte escolar. A reportagem tentou contato com a Prefeitura de Jardim sobre a questão do transporte para as crianças no período da safra do pequi, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição. Também tentamos falar com o Serviço Autônomo de Água e Esgoto do Município, que não se manifestou.
Resistência na água
Maria Miguel de Melo, de 56 anos, mora no mesmo local de onde tira o sustento da família. Marisqueira desde criança, sua casa fica a cerca de 700 metros do Rio Coaçu, em Beberibe, na Região Norte do Estado. "Nasci aqui e desde os 10 anos a gente já ia procurar o meio de sobrevivência na água", lembra.
A categoria da qual faz parte compõe o maior número de famílias que se consideram "povos tradicionais" no Estado, segundo o levantamento do MPF - são pelo menos 5.580 pescadores artesanais.
Para Edivan Dantas, presidente da Associação Comunitária dos Produtores de Parajuru, os pescadores tiveram avanços nos aspectos econômicos e sociais. "Houve melhoria na qualidade de vida", analisa. No entanto, apesar dos progressos, os desafios existentes ainda são latentes. Segundo Raimundo da Rocha Ribeiro, presidente da Federação dos Pescadores do Estado do Ceará, a baixa produção, falta de investimentos e regularização da documentação dos pescadores são os principais desafios.
O representante cobra mais agilidade das autoridades para facilitar o cadastro dos pescadores. "Em abril, iam fazer o recadastramento e ainda não há um planejamento. Não tem como cadastrar as colônias, nem os pescadores", diz Raimundo, ao indicar que o Estado conta com 71 colônias de pescadores associadas à Federação.
Em nota, a Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA) informou que com a extinção da Secretaria de Pesca e Aquicultura do Estado (Seapa), alguns projetos ficaram sob sua responsabilidade, um dele "visa apoiar as colônias de pescadores, disponibilizando equipamentos para melhorar as condições de trabalho e assistência aos pescadores, facilitando a comunicação e integração entre elas os órgãos públicos e privados".
"Poucas colônias entregaram a documentação completa, motivo pelo qual esse cadastro está incompleto ou possui documento pendente", completa a nota. O órgão ressaltou que "através da Célula de Orientação Técnica da Pesca já entrou em contato com a maioria delas, solicitando a documentação pendente", encerra.
>> Análise
Wilson Rocha, Procurador da República
Wilson Rocha, Procurador da República
"O levantamento poderá servir às próprias comunidades, em seus contextos específicos de luta por direitos. Um banco de dados público, contendo informação georreferenciada dos territórios onde as comunidades vivem, poderá aprimorar o diálogo das lideranças tradicionais com os demais agentes públicos e privados com os quais elas se relacionam. A primeira limitação ou dificuldade deve-se à diversidade de grupos compreendidos na categoria povos e comunidades tradicionais, dispersos em todo o território nacional. Assim, deverá haver por parte das instituições e das lideranças comunitárias que participam da Plataforma de Territórios um esforço muito grande de difusão da ferramenta, esclarecendo as próprias comunidades e instituições que as apoiam da possibilidade de alimentar a Plataforma com o registro georreferenciado de seus territórios".
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