Desde que o mundo é mundo o homem migra. De forma temporária ou permanente, o fluxo de pessoas tem motivos mil: a procura por alimento, a fuga de uma guerra iminente ou, como nos versos de Fernando Catatau, simplesmente porque "lá fora tem um lugar que me faz bem, e eu vou lá". Sebastião Salgado, renomado fotógrafo mineiro, imergiu nesse universo tão duro e particular, resultando num apanhado de registros fotográficos que ele batizou de Êxodos. "É uma história perturbadora, pois poucas pessoas abandonam a terra natal por vontade própria", define ele próprio no projeto.
Êxodos chega a Fortaleza para, até o dia 20 de maio, ser um dos destaques da programação da Caixa Cultural (Praia de Iracema). Ao todo, 60 pôsteres em preto-e-branco compõem a mostra, ainda inédita na Capital, que já é um desdobramento do livro homônimo, lançado em 2000 pela Companhia das Letras.
Assim como na publicação, a exposição encontra-se dividida por temas: "Luta pela Terra", "Refugiados e Migrados", "Megacidades", "África" e "Retratos de Crianças". "Com certeza, a parte das crianças é o que toca mais o público. Foi uma coisa que até o próprio Sebastião falava, que as crianças vinham para a frente da câmera. Talvez como se quisessem perpetuar a imagem delas ali na foto. A exposição toda é de uma beleza desconcertante", avalia Elaine Hazin, diretora da Via Press Comunicação, produtora da mostra que já passou por Salvador, Recife, Curitiba e Brasília (DF).
Abandonando sua terra natal em busca de um futuro incerto, as pessoas retratadas pelo fotógrafo chegam ao espectador trazendo a reboque, antes de qualquer coisa, uma reflexão que permeia diversas esferas, do social ao econômico e político. Êxodos, cuja curadoria é de Lélia Wanick Salgado (esposa de Sebastião), reúne situações extremas, o êxodo rural, o conflito de terras, o surgimento de algumas megalópoles como Jacarta e Xangai, sendo as fotos pertencentes ao acervo do Instituto Terra, ONG ambiental criada pelo casal em 1998 e sediada na cidade de Aimorés, onde o fotógrafo nasceu há 74 anos.
Outro ponto destacado por Elaine recai sobre a contemporaneidade dos seus registros, feitos ainda durante a década de 1990 por um período de seis anos em 40 países. "É um tema que ainda permanece muito forte nos dias de hoje. Na parte da Luta pela Terra, por exemplo, tem aquela coisa da esperança por dias melhores. Tem uma dor também presente, no caso das guerras, mas as fotos falam muito de sentimento. E é esse o sentimento que o público também espera", ressalta a produtora.
Autodidata, o fotógrafo cearense Gentil Barreira ressalta o trabalho de Sebastião Salgado no que diz respeito à utilização do preto, do branco e da contraluz. "Ele é um grande documentarista e faz isso de uma forma muito bem resolvida. Fotograficamente falando, ele utiliza a luz, o enquadramento... Tudo é muito bem feito e, para completar tudo isso, ele tem um esquema de produção e de marketing de produção de imagem em excelência", afirma Gentil, que também possui um vasto material que explora estas nuances de cor.
"Tenho a série Coração Sertão, que é toda em preto-e-branco, mas o que aparece mais na mídia são as minhas fotos coloridas. Outro projeto também que eu fiz em Almofala (1979/2010) é todo nessa linha. Às vezes o que falta é chance de mostrar o trabalho. Nós mesmos conhecemos pouco o trabalho dos outros. Conhecemos um Cartier-Bresson, mas não um Celso Oliveira, por exemplo", provoca Gentil. "Mas a minha ligação com a fotografia tem a ver com a minha expressão particular, com as minhas inquietações", completa.
Gentil, que comprou o livro Êxodos ainda à época de seu lançamento, analisa a presença da criança na fotografia. "Sempre vai chamar a atenção. A criança, ela toca a gente, demarca o momento da vida, o início, a fragilidade. Aquela criança refugiada morta que foi veiculada em todos os lugares, à beira da praia, se fosse um velho não causaria um impacto tão grande. Existe também aquela criança queimada, que tornou-se um dos grandes momentos da Guerra do Vietnã: quantas pessoas foram mortas ali, mas aquela criança foi, de fato, o ícone", explica.
Para Elaine Hazin, o compromisso social é uma das marcas do trabalho de Sebastião Salgado. "Ele é um dos nomes mais representativos da fotografia mundial e que traz a verdade através da beleza. Ele tem um compromisso social e traz esse sentido da arte para fazer uma revolução, uma transformação. Fora que a fotografia tem essa capacidade de sensibilizar e ele se envolve com as questões ambientais. A gente não pode fechar os olhos para isso", conclui.
Êxodos, exposição de Sebastião Salgado
Quando: até 20 de maio
Onde: Caixa Cultural Fortaleza (av. Pessoa Anta, 287 - Praia de Iracema)
Visitação: de terça a sábado, das 10h às 20 horas; e domingos, das 12h às 19 horas
Gratuito
Info: (85) 3453 2770, TERESA MONTEIRO
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